POR JOSÉ ALUÍSIO BOTELHO
A fazenda Três Barras, um latifúndio com característica de Sesmaria, foi edificada no século dezenove, na ocasião em que Cristalina era apenas um aglomerado de garimpeiros em busca de fortuna.
O primitivo dono de que se tem notícia foi o rico comerciante português major José Joaquim de Faria Lopes Júnior, estabelecido em Paracatu a partir de meados dos oitocentos, com casa de comércio.
José Joaquim de Faria Lopes Júnior, nascido em 1836, natural no lugar de Sousa, freguesia de Santa Maria de Martim, Concelho de Barcelos, Portugal, filho legítimo de José Joaquim de Faria Lopes e de Custódia Rodrigues de Oliveira, e falecido em Paracatu aos 09/08/1910; foi casado com Lucinda Serafim de Faria Lopes, falecida em 12/10/1916, filha legítima do português mais rico de Paracatu à época, Ricardo Serafim de Sousa Porto e de Jacinta de Affonseca e Silva Costa; com ausência de filhos herdeiros no seu casal ou fora dele, José Joaquim instituiu como herdeira universal sua mulher e deixou legados para suas irmãs em Portugal. Lucinda Serafim, por conseguinte, legou em testamento, aos seus sobrinhos e sobrinhas todo seu patrimônio, sendo que, ao capitão Nélson Hormidas de Oliveira, marido de uma sua sobrinha homônima Lucinda, pela sua abnegação e serviços prestados, legou a quantia de dez contos de réis em dinheiro ou bens a seu critério – optou pela fazenda “Três Barras” em Cristalina Goiás, complementando o valor da propriedade com verba de herança destinada à sua esposa, tornando-se único dono do latifúndio, destinado à criação de gado vacum e cavalar e outros animais de pequeno porte. Transcrição de trecho ilustrativo: “Deixo para o meu compadre e amigo Nélson Hormidas de Oliveira, em recompensa dos muitos favores que me tem prestado, a morada de casa onde atualmente moro e que foi residência de meus pais, e mais a quantia de dez contos de réis (10:000$000 em bens ou dinheiro).”
A fazenda Três Barras, descrita como “fazenda agrícola e de criar”, com casa de morada coberta de telhas em ruínas, cujas divisas rudimentares tinha o seguinte perímetro: ‘Pelas cabeceiras do Ribeirão de São Pedro, que nasce na Serra dos Chrystaes, por ela abaixo até uma barra no Rio São Marcos, por este acima até a barra das Lages ou Laginha e por ela acima até sua cabeceira na Serra dos Chrystaes, com área presumível de 7500 hectares.”
Para se ter uma ideia, no início do século vinte, por ocasião da morte dos proprietários, existiam em seus domínios cerca de 1500 reses de criar, e a fazenda era avaliada em 15 contos de réis.
Na cadeia de sucessão da propriedade, Nélson Hormidas falece em 1930 e a fazenda seria partilhada entre os herdeiros ou vendida em comum acordo; fato é que não soubemos a que mãos a fazenda tomou, por falta de informações concretas. Na ocasião, era administrador da fazenda, seu filho Gastão Hormidas de Oliveira, morador na então Vila de Cristalina.
Década de 1930. Cristalina crescia lentamente, com sua economia baseada predominantemente na extração e comércio do cristal-de-rocha. Na zona rural, havia o predomínio da criação extensiva de gado, destinados a outras praças mais desenvolvidas. A fazenda “Três Barras” estaria certamente inserida neste contexto de obscuridade desenvolvimentista. Nos anos de 1940, quando ocorreu um novo boom do cristal-de-rocha, a propriedade estava em mãos do rico comerciante e extrator do mineral, o senhor Caetano Torres Lima, natural de Paracatu, e permaneceu como patrimônio do mesmo, por duas ou três décadas, totalmente improdutiva. Nos jornais de época, que podem ser consultados no site da Hemeroteca da Biblioteca Nacional, constatam-se vários decretos presidenciais autorizando o proprietário, senhor Caetano Torres Lima, a explorar o mineral “em suas terras da fazenda Três Barras”, notadamente entre 1940 e 1950.
Em 1977, através da Lei Municipal 645, a Câmara Municipal desapropria área de terreno de utilidade pública, situada na fazenda Três Barras, no lugar denominado Chapéu do Sol, para fins turísticos. Na década seguinte, em 1988, o governo federal declara de interesse social, para fins de desapropriação, o referido imóvel rural, classificado como “latifúndio por exploração” com área de 11 mil hectares aproximadamente, para fins de reforma agrária (decreto n.º 96.245 de 30/06/1988). O assentamento das Três Barras, iniciado após a desapropriação com a distribuição de lotes para as famílias sem terras, não logrou êxito, por falta absoluta de incentivos oficiais dos governos que se sucederam e ainda hoje é considerado um assentamento rural improdutivo.
Fontes:
Familysearch.org
1 Inventário de dona Lucinda Serafim de Faria Lopes, 1916.
2 Inventário de Nélson Hormidas de Oliveira, 1930.
Governo Federal e Municipal.
3 Leis Municipais, Câmara de Vereadores de Cristalina, 1977.
4 Decreto-lei 96.245.
5 Jornais da época, Biblioteca Nacional do Brasil.
6 Outros.
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